Absolutamente. É na espera pela iniciativa que o mingau
desanda, porque a panela, quando quente demais por estar muito tempo no fogo,
queima o leite e solta um bocado de saliências que vão de pouquinho, como quem
nada quer, empelotando tudo. O movimento da colher, que antes era feitinho em
seu girar carrossel, depois de muito tempo fazer o que só sabe – girar –, perde
sua graça natural de colher girante – de pau ou de qualquer coisa – e vai
tropeçando nas bordas da panela, talvez à procura do ritmo perdido. E a iniciativa que inicia o desejo de comer o
mingau pronto é também a que dá fim ao processo de preparo, embora, muitas vezes,
o desejo de comer se encerra no próprio desejo, e o mingau, por si só, já não serve
para nada. Talvez seja esta a
problemática global do processo da receita: a distância curta, porém significativa,
entre o prazer que se finda no processo e o gozar que reside para além do processo,
que se esgota no comer. Tendo, então, duas mãos, duas colheres e um mingau, a
grande distância pequena que separa pensar e comer, durante o preparo, pode
resultar em delícia ou dissabor.
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